RM:
Sr. Presidente, que balanço possível se pode fazer deste longo percurso
de reorganização do Sistema Tributário até os dias de hoje.
R.F:
Podemos dizer que herdamos um Sistema Tributário que naturalmente
reflectia os imperativos da administração colonial da altura, desde o
governo de transição até a proclamação da independência nacional. Foi
necessário, em 1978, estabelecer a primeira visão expressa do que devia
ser a vontade do povo moçambicano na reflexão sobre o sistema fiscal
vigente, tomando em conta os imperativos que emergiam dos principais
objectivos estratégicos da política económica.
Isto
significou iniciar todo um processo de revisão do Sistema Tributário,
passando pela simplificação do próprio sistema e revisão dos próprios
dispositivos jurídico-legais de então, e fez com que naturalmente se
enquadrasse no esforço de reforma de administração pública.
Infelizmente, com a guerra civil interna, muitos dos esforços que
poderiam ter resultado no sucesso nos anos seguintes foram gorados,
tiveram que ser interrompidos e a retoma verificou-se depois da
assinatura do Acordo de Paz em 1992, onde diríamos que os principais
objectivos da reforma foram alcançados com relativo êxito.
Em
2002, com efeitos a partir de 2003, foi aprovado o Sistema Tributário
Nacional, o Novo Sistema Tributário Nacional chamado 15/2002, que traçou
as principais linhas mestras da fiscalidade. Dali para frente tudo era
referido com fundamento nessa lei de base do Sistema Tributário
Nacional. Em resultado dessas alterações, em 2006, por Lei da Assembleia
da República nomeadamente no dia 22 de Março, foi criada uma
instituição cuja pretensão era aglutinar justamente os propósitos da
tributação interna com a tributação do comércio externo nomeadamente os
impostos internos e as Alfândegas, quando foi criada a Autoridade
Tributária de Moçambique, que ficou personalizada a partir de Novembro
de 2006.
Em
2006, 30 de Dezembro éramos apenas de 391 mil contribuintes registados,
com o sistema tributário de atribuição de NUIT’s que iniciou em 1992,
ou seja, 7 anos depois da aprovação do Sistema Tributário Nacional.
Fizemos um trabalho aturado, envolvendo todas as províncias do país,
sobretudo as zonas mais recônditas dos distritos onde tínhamos postos de
fronteiras ou estâncias aduaneiras que não estivessem em fronteiras,
mas em áreas interiores, mas também áreas fiscais para cobrança de
impostos internos, para ver a situação concreta e avaliar os mecanismos
criados para garantir este salto em frente na arrecadação fiscal, à
escala nacional.
E
criamos, também, os mecanismos de interacção com os diversos actores da
fiscalidade, desde instituições governamentais, instituições privadas e
contacto directo com personalidades dentro da sociedade civil, a todos
os níveis. Julgamos ser imperioso e necessário iniciar todo um processo
que levou, anos mas tarde, à afirmação dum propósito: alargar a base
tributária, fazendo com que o ingrediente educação fiscal e
popularização do imposto fosse uma apropriação nacional, fosse de todos.
Então, não so conseguimos em termos de dar um salto em frente na
formação e capacitação de quadros, passamos de 10% de formação superior,
em 2006, para um pouco mas de 30%, já a partir de 2011 e seguintes.
Conseguimos assinar mas de 90 memorandos de entendimento, dos quais mais
de 70 com diferentes segmentos da sociedade civil, incluindo sector
informal, académico, grupos religiosos e outras sensibilidades. Isto fez
com que aquele registo de 2006 de 391 mil passasse rigorosamente, com
referência de 31 de Julho passado, a 2.439.812 NUITS atribuídos.
Por
outro lado, conseguimos passar duma informação muito precária na
relação entre a tabela de receitas e a tabela de despesas. Naturalmente,
isto significava um estado de elevado índice de dependência externa,
que em algum momento situou-se na casa dos 60%. Conseguimos inverter
este cenário nos últimos anos, e o ano passado, 2012, foi o ano
sintomático em que conseguimos situar a dependência externa para 29,5%.
Isto foi histórico no país nunca tinha acontecido. Resultou de todos os
esforços, foi o corolário e é uma premissa importante para a revisão das
estratégias do futuro nomeadamente, a partir deste ano, 2013, e
seguintes.
Como
sabemos, este ano traz também outros desbalanços de natureza económica
com impactos fiscais, dali o Orçamento Rectificativo. Foi necessário
rever o orçamento inicial. A tabela de receitas estava fixada em 113.9
mil milhões de meticais, foi revista para 120.5 mil no Orçamento
Rectificativo, e isso significa termos um adicional de 5,8 % em relação à
meta inicialmente traçada. Mas, com o regozijo podemos dizer que, desde
2006 ate ao fecho do ano passado, nós conseguimos sobrecumprir a meta
da Lei Orçamental, todos anos consecutivamente. E este primeiro
semestre, de 1 de Janeiro até 31 de Julho, fizemos 103% da meta da Lei
Orçamental. Fizemos o nosso recenseamento de dados, o apuramento das
informações até o dia 14 de Agosto passado.
RM: Sr. Presidente, no ano passado lograram reduzir a dependência externa para cerca de 29.5%. Para este ano, qual é a previsão?
R.F:A
previsão é nunca nos situarmos aquém dos 35%. Para este ano a nossa
pretensão é fazer com que a dependência externa seja reduzida cada vez
mais. O ideal é atingirmos os números alcançados no ano passado. E todo
esforço está a ser feito.
RM:
E a manter-se este ritmo, quando e que se pensa que o país pode se ver
livre da dependência externa do ponto de vista de orçamento? Precisamos
de quantos anos?
R.F:Nesta
fase, mesmo sem olhar para os reflexos da tributação em sede dos
recursos naturais em grande escala, nós conseguimos reduzir os níveis da
dependência externa. Como disse, no ano passado situou-se em cerca de
29,5% e o propósito e gerir esse intervalo de forma que não possamos
estar numa situação mais agravante do que aquela que enfrentamos no ano
passado. Então, quando houver o efeito do Boom dos recursos naturais, A
expectativa é de que o país possa corrigir este diferencial e consigamos
estar fiscalmente sustentáveis.
RM: Quando é que os grandes projectos começam a pagar o imposto justo ao Estado moçambicano?
R.F:No
caso dos recursos naturais em hidrocarbonetos, gás natural, em
particular, toda a expectativa aponta para que a partir de 2018 se entre
na fase de gás liquefeito, na fase de desenvolvimento. Espera-se,
então, que com essa produção em escala haja uma tributação mais
legítima.
RM: Já há cálculos em termos numéricos do que isso pode significar?
R.F:Isto
vai depender efectivamente da quantidade do gás liquefeito para que se
determine a matéria colectável e se possa calcular o volume do imposto a
pagar. A expectativa é de que, com esta produção, nós possamos produzir
de forma muito significativa na carteira fiscal.
RM:
Moçambique tem uma população activa estimada em cerca de 11 milhões de
habitantes. Desses, apenas cerca de 2.5 milhões possuem o Número Único e
Identificação Tributária, sendo que nem todos que possuem o NUIT pagam
impostos. Quando é que teremos toda a população activa a pagar impostos?
R.F:Isto
resulta, primeiro, de uma consciência livre e soberana do dever do
exercício de cidadania fiscal. É esse esforço que estamos a fazer com a
campanha de popularização do imposto, induzir ao pagamento voluntário.
Por outro lado, importa que a justiça tributária seja visível aos olhos
dos contribuintes, os princípios de equidade, transparência e
integridade sejam apropriados pelo Sistema Tributário Nacional. Isto
conseguido gera mais confiança, fidelidade, credibilidade em relação aos
propósitos da aplicação dessas poupanças fiscais na implementação das
tabelas de despesa. Então, as pessoas quando virem que realmente suas
contribuições garantem uma satisfação equilibrada em todo o território
nacional estou em crer que os níveis da população activa com propensão
para pagar imposto vai crescer de forma adequada, como acontece em
vários países em que isto se conseguiu com sucesso.
RM:
Olhando para o passado histórico, terá sido feito algum diagnóstico ao
nível do sistema para se apurar a razão possível deste défice de
consciência que é bem evidente entre muitos de nós?
R.F:Hás
duas razões que podem ser diagnosticadas de imediato. A primeira foi
diagnosticada já em 1974 – 1975, resultou da acção perversa do próprio
sistema tributário colonial. Este sistema não era naturalmente favorável
à sustentabilidade dos interesses nacionais, satisfazia os interesses
da administração colonial. Na passagem para a independência nacional, a
atitude foi de revolta, de não querer pagar os impostos, julgando-se que
se estava a atender aos pressupostos anteriores. Esta razão vai
persistindo, sobretudo em determinadas zonas de maior influência da
administração colonial, nomeadamente nas periferias. E a outra razão
também consiste em criarmos nós próprios como Estado ou Governo, todos
os predicados de credibilidade do sistema, através de maior justiça
tributária, maior transparência, maior integridade. Isto faz com que a
indução ao pagamento voluntário aumente. São aspectos morais que devem
ser devidamente geridos, articulando com o passado que está a ser
suprido com a popularização do imposto, dizendo-se que ele está a servir
aos interesses públicos nacionais.
RM:
Como é que isso se vê? Através das estradas em condições, escolas em
condições, diferentemente do panorama actual que podemos encontrar um
pouco em quase todo país?
R.F:Isto
é uma leitura importante. Quando o contribuinte, seja ele quem for,
consegue, por virtude de ter contribuído com o pagamento de imposto, se
rever na tabela de despesas, naturalmente que a credibilidade no sistema
de tributação aumenta. Isto induz ao pagamento voluntário, e faz com
que mesmo aqueles casos de evasão fiscal possam, por meio dessa
credibilidade, encontrar pontos de redução ou de extensão.
RM:
Qual é a dificuldade de introduzir o sistema tributário por forma a que
o contribuinte, à semelhança dos outros serviços, se possa servir, por
exemplo, da banca, no lugar de ter que aturar as longas filas, o que
acaba até provocando algum desconforto aos próprios funcionários?
R.F:Nós,
como sabe, iniciamos a aprovação dos instrumentos de modernização do
sistema tributário nacional, quer com a aprovação da e-Tributação que
induz ao pagamento electrónico de impostos, a Janela Única Electrónica,
no caso da moderna gestão aduaneira, sobretudo as relações de comércio
internacional para facilitação do comércio de uma maneira geral e também
garantir uma certa estabilidade e um ambiente de negócio. Mas também
vamos introduzir máquinas fiscais electrónicas que permitem gerir a
facturação a IVA. Sabe também que introduzimos o sistema de inspecção
não intrusiva para combater os ilícitos fiscais, os contrabandos, as
piratarias os terrorismos económicos sobretudo que atravessam as
fronteiras nacionais, sejam elas aéreas, terrestres ou marítimas. Já
temos dispositivos e foram aplicados mais de 50 milhões de dólares no
país, desde 2006 para aqui para permitir que o país tivesse alinhamento
com as boas práticas internacionais. Estamos a estabelecer posto de
Fronteira da Paragem Única moderno e a referência é Ressano Garcia. Quem
for a Ressano Garcia há-de ver já os primeiros sinais que levam
naturalmente a nossa afirmação nesta convergência, para permitir que
haja uma paragem única de facilitação do comércio. Isto tudo são
ingredientes de modernização.
Indo
a questão do papel dos bancos também o e-Tributação para ter sucesso
precisa dessa intercomunicabilidade. O cidadão em sua casa se tem acesso
a internet café via internet pode vir a fazer os seus pagamentos
fiscais sem estar na fila de espera. Por outro lado, pode usar o banco
onde ele é tradicionalmente cliente, para permitir a sua relação com a
fiscalidade. Nós, para este efeito já assinamos acordo de adesão com
nove bancos dos 19 da praça, e com sucesso. E esses bancos já estão a
fazer a administração das poupanças, a intermediação das poupanças
quanto aos impostos do comércio externo. Isso faz parte integrante do
formato da Janela Única Electrónica.
RM: Sr. Presidente, acreditando nas estatísticas do doing business,
em Moçambique temos um total de 37 impostos, cujo pagamento custa mais
de 230 horas. A nível da região acabamos sendo um destaque pela
negativa. Por conseguinte, somos menos competitivos. Que comentário faz?
R.F:Bom,
o que eu devo dizer é que os países têm os seus próprios ordenamentos
jurídico-legais, os seus sistemas tributários e há prós e contras. Por
exemplo, nas Maurícias existe o orgulho de se ter só um único imposto,
mas vai lá ver em termos de evasão fiscal. Portanto, cada país vai para
fazer o estudo se de facto os pontos de evasão se são inferiores aos de
Moçambique…
RM: Diga comparando com o crescimento que tem
Bom, não devo fazer qualquer comentário, um país que é independente, soberano, estável sabe como gerir o seu sistema…
RM: Mas fica implícito
R.F:O que devo dizer é que o ter poucos ou muitos impostos não quer dizer de per si
que seja factor de tranqüilidade, de estabilidade. Muitas vezes pode
ser, também, factor de instabilidade. O ter muitos impostos, quando
devidamente especializados, permite uma certa disciplina fiscal,
sobretudo nas auditorias. A um agregado de impostos, torna-se muito
difícil fazer a devida fiscalização, porque tem que se destrinçar lá,
dentre as variáveis, e encontrar qual o factor causador, e muitas vezes
um é diferente do outro na sua estrutura e muitas vezes isto complica a
própria máquina fiscal. De qualquer maneira, indo àquilo que já foi
definido no próprio sistema tributário nacional, nós em Moçambique
também caminhamos para a simplificação do sistema tributário nacional,
aglutinando até muitas categorias tributárias. Isto vai acontecer. E um
exemplo do que pode acontecer a curto prazo é a combinação do sistema
tributário autárquico nacional. Portanto há alguns impostos autárquicos
nacionais que vão estar aglutinados. O cidadão paga o imposto apenas na
região autárquica, para evitar que tenha que pagar vários e diferentes
na mesma zona onde vive. Este esforço já está ser combinado a partir da
autarquia de Maputo.
RM:
Sr.Presidente, do ponto de vista da tributação, o sector produtivo está
ser tratado de forma diferenciada numa situação que aparenta filhos e
enteados. O sector da agricultura, por exemplo, que é a base do
desenvolvimento do país, paga um imposto de cerca de 10%, enquanto a
indústria, factor dinamizador, é taxada cerca de 37%, o mesmo valor que
paga o comércio e os serviços. Sr. Presidente, não acha que esta pode
ser uma das causas do estado frágil em que se encontra a nossa
indústria, a reclamar algum carinho?
R.F:
Bem, como sabe, por imperativos da Constituição da República a
agricultura é a base do desenvolvimento. Isto está patente, portanto se é
constitucional é para cumprimento e o seu papel no Produto Interno
Bruto ronda os 23 e 25 porcento e emprega 70 porcento da mão-de-obra em
termos nacionais. Portanto, é um sector privilegiado, ao qual nós
estamos a dar todo o acarinhamento. Está na mesa de discussão o sistema
da tributação e IVA para a agricultura. Este sistema vai ser revisto. Na
prática, já há muitas facilidades dadas a muitos segmentos na
agricultura, sobretudo na área de oleaginosas. Exemplo disto é o
tratamento que é dado ao açúcar. Isto vai se estender também a outras
áreas, consoante as pressões que são colocadas. Portanto isso não se põe
em causa. O papel da agricultura terá que ser visto também do ponto de
vista da fiscalidade que é exercida, e nós estamos a trabalhar com o
sector privado nesse sentido. Portanto, até o final deste ano haverá um
pacote para entrar em vigor, se tudo correr bem, em 2014.
RM:
Sr. Presidente, o capital multinacional, consubstanciado pelos
mega-projectos, na área dos hidrocarbonetos, a exemplo do que falamos
aqui, continua a representar uma injustiça ao Estado moçambicano,
olhando para contribuição modesta nos impostos. Que medo há para uma
tributação justa deste sector, teme-se que o investimento que está sendo
feito possa retirar-se do país?
R.F: Não há medo, nem deve haver medo, o que há é prudência. Trata-se de um sector novo em termos de produção e geração…
RM: Estamos a ser excessivamente prudentes
R.F:
E é preciso ser-se muito prudente quando se trata de atrair
investimento. Como sabe, o diagnóstico sobre as potencialidades em
hidrocarbonetos já estava feito nos anos 50 para Moçambique. Portanto,
as informações da administração de antes da nossa independência já
produziam alguns elementos quanto a eventuais potencialidades em riqueza
petrolífera, em particular, em Moçambique, sobretudo em
hidrocarbonetos. As interrupções, com a guerra civil, não permitiram dar
tranquilidade a fazer prospecção mais aturada porque implica dinheiro.
Uma perfuração pequena de gás natural pode custar 100 milhões de
dólares, uma única perfuração, em custo de perfuração. Portanto, estou a
falar na verticalidade da perfuração, isto é muito dinheiro que se
emprega, que se investe, e é por conta e risco do investidor, que espera
recuperar depois. Portanto tem que se pensar nesses termos. Agora, nós
temos que gerir a vida útil dessa riqueza não renovável, e permitir
equacionar isso com os ganhos que o país tem que ter no decurso do tempo
que vai mesmo de anos do período de desenvolvimento em todas as
aplicações de dinheiro.
RM:
Sr. Presidente, Esta prudência inspira-se em que modelo conhecido pelo
menos ao nível da região, porque este capital multi-nacional se vem para
cá é porque também precisa da nossa matéria-prima para a robustez dos
seus Estados. Não podemos ser prejudicados por causa disso.
R.F:Sem
dúvida. Mas o que eu devo dizer é que nos últimos anos assiste-se a uma
ligeira melhoria de prestação dos mega-projectos nos impostos que são
pagos, sobretudo a partir de 2009 para cá. Não atinge, no seu conjunto a
casa dos 7% da carteira fiscal. Não atingiu no seu conjunto sequer 1%
do PIB. Mas já estamos a racionalizar os benefícios fiscais. Isto foi
decisão do Conselho de Ministros. Não há contrato nenhum que é assinado
agora sem que esse pressuposto de racionalização seja plasmado, porque
se impõe, para permitir que haja todos os ganhos possíveis de
fiscalidade, que são transferidos para o tesouro, para permitir que o
país ganhe mesmo antes da fase de maturação daqueles projectos de
desenvolvimento. Mas precisamos de atrair investimentos, sejam nacionais
ou estrangeiros, para dar sustentabilidade a eles próprios e irmos
fazendo as incidências na medida dos imperativos de lei. É o que estamos
a fazer.
RM: Sr. Presidente, o sector privado ainda não está satisfeito com os timings do reembolso do IVA. Qual é a dificuldade? Este é um debate que dura já há bastante tempo.
R.F:Bom,
a razão principal reside sobretudo nas declarações dos valores a
receber, na estrutura das declarações. Quando uma certa entidade privada
diz, por exemplo, que tem a receber 100.000mt, não quer dizer
necessariamente que os números que oferece e os dados e a circunstância
que apresenta legitimam esse direito. Nossa obrigação é imediatamente
fazer uma apreciação analítica e processual, vermos todos os contornos
do seu direito ao reembolso e então distinguir entre o potencial e o
efectivo, entre aquilo que ele apresenta que é o potencial e aquilo que é
efectivo que resulta do cálculo realista face à situação concreta do
sujeito passivo. Muitas vezes há um grande diferencial entre o potencial
e o efectivo. Quando se chega ao efectivo, existe um plano de
reembolso, o dinheiro é requisitado à direcção do orçamento. Há uma
previsão do orçamento para os reembolsos que fica cativa na tabela das
despesas, para permitir que, como fruto dessa requisição, o dinheiro
flua para poder suportar os pedidos dos reembolsos, em sede de qualquer
imposto. Só o reembolso em IVA, são mais de 97% na carteira. Desses 97%,
70% são dos mega-projectos nomeadamente mineradoras. Então, se nós
tirarmos as mineradoras vamos ver um caso curioso em que a dívida
tributária, que é o dinheiro que essas mesmas empresas têm para pagar o
Estado, fica visivelmente superior do que o saldo dos reembolsos. Se
pusermos ali os mega-projectos fica com impacto invertido. A respeito
disso, em termos de números, nós temos em saldo de reembolsos no país,
no global, como dívida potencial, está na casa dos 285 milhões de
dólares. Mas a dívida tributária está em 170 milhões de dólares, que é a
dívida que as empresas têm. Se tirarmos a componente dos 70% em IVA dos
mega-projectos, ficamos com um diferencial líquido a crédito a favor do
Estado. Portanto, o Estado estaria em vantagem na gestão do
diferencial. A partir de 2015 se prevê um tratamento fiscal apropriado
para esses casos, sobretudo por causa das incidências desses
mega-projectos, um tratamento adequado à política dos reembolsos.
RM: Sr. Presidente, o Sistema Tributário em Moçambique já está isento finalmente do fenómeno da corrupção?
R.F:No
mundo inteiro é difícil encontrar um sistema tributário que fique
isento da corrupção. O ideal é resolver ou melhorar ou todo esforço
fazer para que essa expressão da corrupção não se repercuta sobre o
direito do cidadão de ver o dinheiro que pôs no sistema de tributacao se
reflectir na tabela de despesas públicas para satisfazer as suas
necessidades, que é o pior drama que pode acontecer com o contribuinte.
De 2007 até 2012 foram abertos 4846 processos fiscais só na área
aduaneira. No conjunto, área aduaneira e área fiscal, nós tivemos, no
período 2007 a 2012 uma recuperação de 8 mil milhões de meticais, dos
quais um pouco mais de 2 milhões, ¼ disto na área dos impostos de
comércio externo. Nesse lapso de tempo, 150 casos foram identificados,
envolvendo 300 funcionários que foram tratados em sede própria,
envolvendo entidades competentes. Nós assinamos memorando de
entendimento com a Procuradoria Geral da República, com vários segmentos
do sector empresarial, CTA, Associações económicas, Agente Comercial da
Beira, de Maputo, a Confederação das Indústrias. Ali prefigurámos sobre
o aspecto de combate em conjunto de cenários que possam pôr em causa o
desenvolvimento harmonioso entre as duas instituições. Assinámos um
memorando com o IESE, sobretudo na monitoria de informação, aquela que é
autorizada oficialmente, estatística do comportamento da fiscalidade.
Também temos boas relações com o centro de integridade pública na
prestação de informações é tempo útil quando nos é solicitada, naquilo
que a Lei permite a informação é dada. Assinamos um código de ética,
envolvendo cada um dos funcionários desde Janeiro de 2009 e fizemos a
apresentação há dias da nossa comissão de ética da instituição. Isto
visa também o reforço para o combate à corrupção e nosso alinhamento nos
princípios de transparência e integridade. Isto constitui o apanágio do
funcionamento da administração tributária.
RM:
Sr. Presidente, onde está a valorização do factor humano? Sustento esta
minha questão com o facto de, em algum tempo, termos estado a assistir
assassinatos de funcionários que oferecem as suas vidas em prol da
cobrança de mais impostos para o país. São assassinatos que até hoje, ao
fim do tempo que passa, não chegaram a ser esclarecidos.
R:F:
Nós próprios, eu na administração da instituição, estamos ainda
preocupados pela ausência de resultados dessa investigação, nomeadamente
do assassinato daquele que foi nosso Director de Investigação e
Auditoria. Era nosso Quadro de confiança, foi colocado ali justamente
pelas qualidades que ele tinha, de poder enfrentar ou debelar estes
males. Naturalmente o caso foi entregue em sede própria de investigação,
no tribunal, e os passos estão a ser dados para fazer o devido
apuramento. Não ficámos de braços cruzados, fizemos uma análise interna
apropriada. Fomos buscar um Quadro fora da Cidade de Maputo, que assumiu
as funções de Director dessa área. Fizemos o reforço ainda há poucas
semanas à Direccão de Investigação e Auditoria, para permitir o seu
apetrechamento e capacitação. Fizemos também acordos com organismos
internacionais para que de forma independente vigiem o comportamento
destas funcionalidades, porque achamos que nós próprios não seremos
suficientes, mesmo com os memorandos assinados com instituições
relevantes. Preferimos também manter relações internacionais ao nível
da região para melhor consolidação deste propósito, sobretudo quando o
crime é transnacional. Para permitir que dessa transnacionalidade não se
verifique a repercussão para dentro, dando intranquilidade à circulação
de bens e mercadorias, preferimos estabelecer estes acordos com os
países da região.
RM:
Sr. Presidente, para quando o cachimbo da paz entre a Autoridade
Tributária de Moçambique e o sector privado, do ponto de vista da
inspecção intrusiva?
R.F:
o Cachimbo da paz há-de ser quando o Estado se apropriar do sistema de
inspeçcão não intrusiva, porque o contrato de concessão remete ao sector
privado, no caso da concessionária, a titularidade dos dispositivos dos
equipamentos que foram investidos. Nós, como administração tributária,
criámos uma divisão de inspecção à inspecção não intrusiva. E temos
feito uma intervenção directa. Aliás os resultados desta intervenção
foram várias harmonizações que se encontraram, que deram sucesso à
estabilidade do sistema tarifário que já foi pior. De 2007 para aqui é
um sistema tarifário minimamente consensual, não idealmente consensual,
mas é muito melhor do que aquele que existia em 2006.