segunda-feira, 9 de setembro de 2013

RM ENTREVISTA ROSÁRIO FERNANDES PRESIDENTE DA AT

O Presidente da Autoridade Tributária de Moçambique concedeu, em Agosto último, uma entrevista à Rádio Moçambique, subordinada a uma reflexão sobre o Sistema Tributário no país, desde a reforma, em 2002, até aos dias de hoje. Confira, em seguida, parte da mesma.

RM: Sr. Presidente, que balanço possível se pode fazer deste longo percurso de reorganização do Sistema Tributário até os dias de hoje.
R.F: Podemos dizer que herdamos um Sistema Tributário que naturalmente reflectia os imperativos da administração colonial da altura, desde o governo de transição até a proclamação da independência nacional. Foi necessário, em 1978, estabelecer a primeira visão expressa do que devia ser a vontade do povo moçambicano na reflexão sobre o sistema fiscal vigente, tomando em conta os imperativos que emergiam dos principais objectivos estratégicos da política económica.
Isto significou iniciar todo um processo de revisão do Sistema Tributário, passando pela simplificação do próprio sistema e revisão dos próprios dispositivos jurídico-legais de então, e fez com que naturalmente se enquadrasse no esforço de reforma de administração pública. Infelizmente, com a guerra civil interna, muitos dos esforços que poderiam ter resultado no sucesso nos anos seguintes foram gorados, tiveram que ser interrompidos e a retoma verificou-se depois da assinatura do Acordo de Paz em 1992, onde diríamos que os principais objectivos da reforma foram alcançados com relativo êxito.
Em 2002, com efeitos a partir de 2003, foi aprovado o Sistema Tributário Nacional, o Novo Sistema Tributário Nacional chamado 15/2002, que traçou as principais linhas mestras da fiscalidade. Dali para frente tudo era referido com fundamento nessa lei de base do Sistema Tributário Nacional. Em resultado dessas alterações, em 2006, por Lei da Assembleia da República nomeadamente no dia 22 de Março, foi criada uma instituição cuja pretensão era aglutinar justamente os propósitos da tributação interna com a tributação do comércio externo nomeadamente os impostos internos e as Alfândegas, quando foi criada a Autoridade Tributária de Moçambique, que ficou personalizada a partir de Novembro de 2006.
Em 2006, 30 de Dezembro éramos apenas de 391 mil contribuintes registados, com o sistema tributário de atribuição de NUIT’s que iniciou em 1992, ou seja, 7 anos depois da aprovação do Sistema Tributário Nacional. Fizemos um trabalho aturado, envolvendo todas as províncias do país, sobretudo as zonas mais recônditas dos distritos onde tínhamos postos de fronteiras ou estâncias aduaneiras que não estivessem em fronteiras, mas em áreas interiores, mas também áreas fiscais para cobrança de impostos internos, para ver a situação concreta e avaliar os mecanismos criados para garantir este salto em frente na arrecadação fiscal, à escala nacional.
E criamos, também, os mecanismos de interacção com os diversos actores da fiscalidade, desde instituições governamentais, instituições privadas e contacto directo com personalidades dentro da sociedade civil, a todos os níveis. Julgamos ser imperioso e necessário iniciar todo um processo que levou, anos mas tarde, à afirmação dum propósito: alargar a base tributária, fazendo com que o ingrediente educação fiscal e popularização do imposto fosse uma apropriação nacional, fosse de todos. Então, não so conseguimos em termos de dar um salto em frente na formação e capacitação de quadros, passamos de 10% de formação superior, em 2006, para um pouco mas de 30%, já a partir de 2011 e seguintes. Conseguimos assinar mas de 90 memorandos de entendimento, dos quais mais de 70 com diferentes segmentos da sociedade civil, incluindo sector informal, académico, grupos religiosos e outras sensibilidades. Isto fez com que aquele registo de 2006 de 391 mil passasse rigorosamente, com referência de 31 de Julho passado, a 2.439.812 NUITS atribuídos.
Por outro lado, conseguimos passar duma informação muito precária na relação entre a tabela de receitas e a tabela de despesas. Naturalmente, isto significava um estado de elevado índice de dependência externa, que em algum momento situou-se na casa dos 60%. Conseguimos inverter este cenário nos últimos anos, e o ano passado, 2012, foi o ano sintomático em que conseguimos situar a dependência externa para 29,5%. Isto foi histórico no país nunca tinha acontecido. Resultou de todos os esforços, foi o corolário e é uma premissa importante para a revisão das estratégias do futuro nomeadamente, a partir deste ano, 2013, e seguintes.
Como sabemos, este ano traz também outros desbalanços de natureza económica com impactos fiscais, dali o Orçamento Rectificativo. Foi necessário rever o orçamento inicial. A tabela de receitas estava fixada em 113.9 mil milhões de meticais, foi revista para 120.5 mil no Orçamento Rectificativo, e isso significa termos um adicional de 5,8 % em relação à meta inicialmente traçada. Mas, com o regozijo podemos dizer que, desde 2006 ate ao fecho do ano passado, nós conseguimos sobrecumprir a meta da Lei Orçamental, todos anos consecutivamente. E este primeiro semestre, de 1 de Janeiro até 31 de Julho, fizemos 103% da meta da Lei Orçamental. Fizemos o nosso recenseamento de dados, o apuramento das informações até o dia 14 de Agosto passado.

RM: Sr. Presidente, no ano passado lograram reduzir a dependência externa para cerca de 29.5%. Para este ano, qual é a previsão?
R.F:A previsão é nunca nos situarmos aquém dos 35%. Para este ano a nossa pretensão é fazer com que a dependência externa seja reduzida cada vez mais. O ideal é atingirmos os números alcançados no ano passado. E todo esforço está a ser feito.
RM: E a manter-se este ritmo, quando e que se pensa que o país pode se ver livre da dependência externa do ponto de vista de orçamento? Precisamos de quantos anos?
R.F:Nesta fase, mesmo sem olhar para os reflexos da tributação em sede dos recursos naturais em grande escala, nós conseguimos reduzir os níveis da dependência externa. Como disse, no ano passado situou-se em cerca de 29,5% e o propósito e gerir esse intervalo de forma que não possamos estar numa situação mais agravante do que aquela que enfrentamos no ano passado. Então, quando houver o efeito do Boom dos recursos naturais, A expectativa é de que o país possa corrigir este diferencial e consigamos estar fiscalmente sustentáveis.

RM: Quando é que os grandes projectos começam a pagar o imposto justo ao Estado moçambicano?
R.F:No caso dos recursos naturais em hidrocarbonetos, gás natural, em particular, toda a expectativa aponta para que a partir de 2018 se entre na fase de gás liquefeito, na fase de desenvolvimento. Espera-se, então, que com essa produção em escala haja uma tributação mais legítima.

RM: Já há cálculos em termos numéricos do que isso pode significar?
R.F:Isto vai depender efectivamente da quantidade do gás liquefeito para que se determine a matéria colectável e se possa calcular o volume do imposto a pagar. A expectativa é de que, com esta produção, nós possamos produzir de forma muito significativa na carteira fiscal.
RM: Moçambique tem uma população activa estimada em cerca de 11 milhões de habitantes. Desses, apenas cerca de 2.5 milhões possuem o Número Único e Identificação Tributária, sendo que nem todos que possuem o NUIT pagam impostos. Quando é que teremos toda a população activa a pagar impostos?

R.F:Isto resulta, primeiro, de uma consciência livre e soberana do dever do exercício de cidadania fiscal. É esse esforço que estamos a fazer com a campanha de popularização do imposto, induzir ao pagamento voluntário. Por outro lado, importa que a justiça tributária seja visível aos olhos dos contribuintes, os princípios de equidade, transparência e integridade sejam apropriados pelo Sistema Tributário Nacional. Isto conseguido gera mais confiança, fidelidade, credibilidade em relação aos propósitos da aplicação dessas poupanças fiscais na implementação das tabelas de despesa. Então, as pessoas quando virem que realmente suas contribuições garantem uma satisfação equilibrada em todo o território nacional estou em crer que os níveis da população activa com propensão para pagar imposto vai crescer de forma adequada, como acontece em vários países em que isto se conseguiu com sucesso.

RM: Olhando para o passado histórico, terá sido feito algum diagnóstico ao nível do sistema para se apurar a razão possível deste défice de consciência que é bem evidente entre muitos de nós?
R.F:Hás duas razões que podem ser diagnosticadas de imediato. A primeira foi diagnosticada já em 1974 – 1975, resultou da acção perversa do próprio sistema tributário colonial. Este sistema não era naturalmente favorável à sustentabilidade dos interesses nacionais, satisfazia os interesses da administração colonial. Na passagem para a independência nacional, a atitude foi de revolta, de não querer pagar os impostos, julgando-se que se estava a atender aos pressupostos anteriores. Esta razão vai persistindo, sobretudo em determinadas zonas de maior influência da administração colonial, nomeadamente nas periferias. E a outra razão também consiste em criarmos nós próprios como Estado ou Governo, todos os predicados de credibilidade do sistema, através de maior justiça tributária, maior transparência, maior integridade. Isto faz com que a indução ao pagamento voluntário aumente. São aspectos morais que devem ser devidamente geridos, articulando com o passado que está a ser suprido com a popularização do imposto, dizendo-se que ele está a servir aos interesses públicos nacionais.

RM: Como é que isso se vê? Através das estradas em condições, escolas em condições, diferentemente do panorama actual que podemos encontrar um pouco em quase todo país?
R.F:Isto é uma leitura importante. Quando o contribuinte, seja ele quem for, consegue, por virtude de ter contribuído com o pagamento de imposto, se rever na tabela de despesas, naturalmente que a credibilidade no sistema de tributação aumenta. Isto induz ao pagamento voluntário, e faz com que mesmo aqueles casos de evasão fiscal possam, por meio dessa credibilidade, encontrar pontos de redução ou de extensão.

RM: Qual é a dificuldade de introduzir o sistema tributário por forma a que o contribuinte, à semelhança dos outros serviços, se possa servir, por exemplo, da banca, no lugar de ter que aturar as longas filas, o que acaba até provocando algum desconforto aos próprios funcionários?
R.F:Nós, como sabe, iniciamos a aprovação dos instrumentos de modernização do sistema tributário nacional, quer com a aprovação da e-Tributação que induz ao pagamento electrónico de impostos, a Janela Única Electrónica, no caso da moderna gestão aduaneira, sobretudo as relações de comércio internacional para facilitação do comércio de uma maneira geral e também garantir uma certa estabilidade e um ambiente de negócio. Mas também vamos introduzir máquinas fiscais electrónicas que permitem gerir a facturação a IVA. Sabe também que introduzimos o sistema de inspecção não intrusiva para combater os ilícitos fiscais, os contrabandos, as piratarias os terrorismos económicos sobretudo que atravessam as fronteiras nacionais, sejam elas aéreas, terrestres ou marítimas. Já temos dispositivos e foram aplicados mais de 50 milhões de dólares no país, desde 2006 para aqui para permitir que o país tivesse alinhamento com as boas práticas internacionais. Estamos a estabelecer posto de Fronteira da Paragem Única moderno e a referência é Ressano Garcia. Quem for a Ressano Garcia há-de ver já os primeiros sinais que levam naturalmente a nossa afirmação nesta convergência, para permitir que haja uma paragem única de facilitação do comércio. Isto tudo são ingredientes de modernização.
Indo a questão do papel dos bancos também o e-Tributação para ter sucesso precisa dessa intercomunicabilidade. O cidadão em sua casa se tem acesso a internet café via internet pode vir a fazer os seus pagamentos fiscais sem estar na fila de espera. Por outro lado, pode usar o banco onde ele é tradicionalmente cliente, para permitir a sua relação com a fiscalidade. Nós, para este efeito já assinamos acordo de adesão com nove bancos dos 19 da praça, e com sucesso. E esses bancos já estão a fazer a administração das poupanças, a intermediação das poupanças quanto aos impostos do comércio externo. Isso faz parte integrante do formato da Janela Única Electrónica.

RM: Sr. Presidente, acreditando nas estatísticas do doing business, em Moçambique temos um total de 37 impostos, cujo pagamento custa mais de 230 horas. A nível da região acabamos sendo um destaque pela negativa. Por conseguinte, somos menos competitivos. Que comentário faz?
R.F:Bom, o que eu devo dizer é que os países têm os seus próprios ordenamentos jurídico-legais, os seus sistemas tributários e há prós e contras. Por exemplo, nas Maurícias existe o orgulho de se ter só um único imposto, mas vai lá ver em termos de evasão fiscal. Portanto, cada país vai para fazer o estudo se de facto os pontos de evasão se são inferiores aos de Moçambique…

RM: Diga comparando com o crescimento que tem
Bom, não devo fazer qualquer comentário, um país que é independente, soberano, estável sabe como gerir o seu sistema…

RM: Mas fica implícito
R.F:O que devo dizer é que o ter poucos ou muitos impostos não quer dizer de per si que seja factor de tranqüilidade, de estabilidade. Muitas vezes pode ser, também, factor de instabilidade. O ter muitos impostos, quando devidamente especializados, permite uma certa disciplina fiscal, sobretudo nas auditorias. A um agregado de impostos, torna-se muito difícil fazer a devida fiscalização, porque tem que se destrinçar lá, dentre as variáveis, e encontrar qual o factor causador, e muitas vezes um é diferente do outro na sua estrutura e muitas vezes isto complica a própria máquina fiscal. De qualquer maneira, indo àquilo que já foi definido no próprio sistema tributário nacional, nós em Moçambique também caminhamos para a simplificação do sistema tributário nacional, aglutinando até muitas categorias tributárias. Isto vai acontecer. E um exemplo do que pode acontecer a curto prazo é a combinação do sistema tributário autárquico nacional. Portanto há alguns impostos autárquicos nacionais que vão estar aglutinados. O cidadão paga o imposto apenas na região autárquica, para evitar que tenha que pagar vários e diferentes na mesma zona onde vive. Este esforço já está ser combinado a partir da autarquia de Maputo.

RM: Sr.Presidente, do ponto de vista da tributação, o sector produtivo está ser tratado de forma diferenciada numa situação que aparenta filhos e enteados. O sector da agricultura, por exemplo, que é a base do desenvolvimento do país, paga um imposto de cerca de 10%, enquanto a indústria, factor dinamizador, é taxada cerca de 37%, o mesmo valor que paga o comércio e os serviços. Sr. Presidente, não acha que esta pode ser uma das causas do estado frágil em que se encontra a nossa indústria, a reclamar algum carinho?
R.F: Bem, como sabe, por imperativos da Constituição da República a agricultura é a base do desenvolvimento. Isto está patente, portanto se é constitucional é para cumprimento e o seu papel no Produto Interno Bruto ronda os 23 e 25 porcento e emprega 70 porcento da mão-de-obra em termos nacionais. Portanto, é um sector privilegiado, ao qual nós estamos a dar todo o acarinhamento. Está na mesa de discussão o sistema da tributação e IVA para a agricultura. Este sistema vai ser revisto. Na prática, já há muitas facilidades dadas a muitos segmentos na agricultura, sobretudo na área de oleaginosas. Exemplo disto é o tratamento que é dado ao açúcar. Isto vai se estender também a outras áreas, consoante as pressões que são colocadas. Portanto isso não se põe em causa. O papel da agricultura terá que ser visto também do ponto de vista da fiscalidade que é exercida, e nós estamos a trabalhar com o sector privado nesse sentido. Portanto, até o final deste ano haverá um pacote para entrar em vigor, se tudo correr bem, em 2014.

RM: Sr. Presidente, o capital multinacional, consubstanciado pelos mega-projectos, na área dos hidrocarbonetos, a exemplo do que falamos aqui, continua a representar uma injustiça ao Estado moçambicano, olhando para contribuição modesta nos impostos. Que medo há para uma tributação justa deste sector, teme-se que o investimento que está sendo feito possa retirar-se do país?
R.F: Não há medo, nem deve haver medo, o que há é prudência. Trata-se de um sector novo em termos de produção e geração…

RM: Estamos a ser excessivamente prudentes
R.F: E é preciso ser-se muito prudente quando se trata de atrair investimento. Como sabe, o diagnóstico sobre as potencialidades em hidrocarbonetos já estava feito nos anos 50 para Moçambique. Portanto, as informações da administração de antes da nossa independência já produziam alguns elementos quanto a eventuais potencialidades em riqueza petrolífera, em particular, em Moçambique, sobretudo em hidrocarbonetos. As interrupções, com a guerra civil, não permitiram dar tranquilidade a fazer prospecção mais aturada porque implica dinheiro. Uma perfuração pequena de gás natural pode custar 100 milhões de dólares, uma única perfuração, em custo de perfuração. Portanto, estou a falar na verticalidade da perfuração, isto é muito dinheiro que se emprega, que se investe, e é por conta e risco do investidor, que espera recuperar depois. Portanto tem que se pensar nesses termos. Agora, nós temos que gerir a vida útil dessa riqueza não renovável, e permitir equacionar isso com os ganhos que o país tem que ter no decurso do tempo que vai mesmo de anos do período de desenvolvimento em todas as aplicações de dinheiro.

RM:  Sr. Presidente, Esta prudência inspira-se em que modelo conhecido pelo menos ao nível da região, porque este capital multi-nacional se vem para cá é porque também precisa da nossa matéria-prima para a robustez dos seus Estados. Não podemos ser prejudicados por causa disso.
R.F:Sem dúvida. Mas o que eu devo dizer é que nos últimos anos assiste-se a uma ligeira melhoria de prestação dos mega-projectos nos impostos que são pagos, sobretudo a partir de 2009 para cá. Não atinge, no seu conjunto a casa dos 7% da carteira fiscal. Não atingiu no seu conjunto sequer 1% do PIB. Mas já estamos a racionalizar os benefícios fiscais. Isto foi decisão do Conselho de Ministros. Não há contrato nenhum que é assinado agora sem que esse pressuposto de racionalização seja plasmado, porque se impõe, para permitir que haja todos os ganhos possíveis de fiscalidade, que são transferidos para o tesouro, para permitir que o país ganhe mesmo antes da fase de maturação daqueles projectos de desenvolvimento. Mas precisamos de atrair investimentos, sejam nacionais ou estrangeiros, para dar sustentabilidade a eles próprios e irmos fazendo as incidências na medida dos imperativos de lei. É o que estamos a fazer.

RM: Sr. Presidente, o sector privado ainda não está satisfeito com os timings do reembolso do IVA. Qual é a dificuldade? Este é um debate que dura já há bastante tempo.
R.F:Bom, a razão principal reside sobretudo nas declarações dos valores a receber, na estrutura das declarações. Quando uma certa entidade privada diz, por exemplo, que tem a receber 100.000mt, não quer dizer necessariamente que os números que oferece e os dados e a circunstância que apresenta legitimam esse direito. Nossa obrigação é imediatamente fazer uma apreciação analítica e processual, vermos todos os contornos do seu direito ao reembolso e então distinguir entre o potencial e o efectivo, entre aquilo que ele apresenta que é o potencial e aquilo que é efectivo que resulta do cálculo realista face à situação concreta do sujeito passivo. Muitas vezes há um grande diferencial entre o potencial e o efectivo. Quando se chega ao efectivo, existe um plano de reembolso, o dinheiro é requisitado à direcção do orçamento. Há uma previsão do orçamento para os reembolsos que fica cativa na tabela das despesas, para permitir que, como fruto dessa requisição, o dinheiro flua para poder suportar os pedidos dos reembolsos, em sede de qualquer imposto. Só o reembolso em IVA, são mais de 97% na carteira. Desses 97%, 70% são dos mega-projectos nomeadamente mineradoras. Então, se nós tirarmos as mineradoras vamos ver um caso curioso em que a dívida tributária, que é o dinheiro que essas mesmas empresas têm para pagar o Estado, fica visivelmente superior do que o saldo dos reembolsos. Se pusermos ali os mega-projectos fica com impacto invertido. A respeito disso, em termos de números, nós temos em saldo de reembolsos no país, no global, como dívida potencial, está na casa dos 285 milhões de dólares. Mas a dívida tributária está em 170 milhões de dólares, que é a dívida que as empresas têm. Se tirarmos a componente dos 70% em IVA dos mega-projectos, ficamos com um diferencial líquido a crédito a favor do Estado. Portanto, o Estado estaria em vantagem na gestão do diferencial. A partir de 2015 se prevê um tratamento fiscal apropriado para esses casos, sobretudo por causa das incidências desses mega-projectos, um tratamento adequado à política dos reembolsos.
RM: Sr. Presidente, o Sistema Tributário em Moçambique já está isento finalmente do fenómeno da corrupção?
R.F:No mundo inteiro é difícil encontrar um sistema tributário que fique isento da corrupção. O ideal é resolver ou melhorar ou todo esforço fazer para que essa expressão da corrupção não se repercuta sobre o direito do cidadão de ver o dinheiro que pôs no sistema de tributacao se reflectir na tabela de despesas públicas para satisfazer as suas necessidades, que é o pior drama que pode acontecer com o contribuinte. De 2007 até 2012 foram abertos 4846 processos fiscais só na área aduaneira. No conjunto, área aduaneira e área fiscal, nós tivemos, no período 2007 a 2012 uma recuperação de 8 mil milhões de meticais, dos quais um pouco mais de 2 milhões, ¼ disto na área dos impostos de comércio externo. Nesse lapso de tempo, 150 casos foram identificados, envolvendo 300 funcionários que foram tratados em sede própria, envolvendo entidades competentes. Nós assinamos memorando de entendimento com a Procuradoria Geral da República, com vários segmentos do sector empresarial, CTA, Associações económicas, Agente Comercial da Beira, de Maputo, a Confederação das Indústrias. Ali prefigurámos sobre o aspecto de combate em conjunto de cenários que possam pôr em causa o desenvolvimento harmonioso entre as duas instituições. Assinámos um memorando com o IESE, sobretudo na monitoria de informação, aquela que é autorizada oficialmente, estatística do comportamento da fiscalidade. Também temos boas relações com o centro de integridade pública na prestação de informações é tempo útil quando nos é solicitada, naquilo que a Lei permite a informação é dada. Assinamos um código de ética, envolvendo cada um dos funcionários desde Janeiro de 2009 e fizemos a apresentação há dias da nossa comissão de ética da instituição. Isto visa também o reforço para o combate à corrupção e nosso alinhamento nos princípios de transparência e integridade. Isto constitui o apanágio do funcionamento da administração tributária.

RM: Sr. Presidente, onde está a valorização do factor humano? Sustento esta minha questão com o facto de, em algum tempo, termos estado a assistir assassinatos de funcionários que oferecem as suas vidas em prol da cobrança de mais impostos para o país. São assassinatos que até hoje, ao fim do tempo que passa, não chegaram a ser esclarecidos.
R:F: Nós próprios, eu na administração da instituição, estamos ainda preocupados pela ausência de resultados dessa investigação, nomeadamente do assassinato daquele que foi nosso Director de Investigação e Auditoria. Era nosso Quadro de confiança, foi colocado ali justamente pelas qualidades que ele tinha, de poder enfrentar ou debelar estes males. Naturalmente o caso foi entregue em sede própria de investigação, no tribunal, e os passos estão a ser dados para fazer o devido apuramento. Não ficámos de braços cruzados, fizemos uma análise interna apropriada. Fomos buscar um Quadro fora da Cidade de Maputo, que assumiu as funções de Director dessa área. Fizemos o reforço ainda há poucas semanas à Direccão de Investigação e Auditoria, para permitir o seu apetrechamento e capacitação. Fizemos também acordos com organismos internacionais para que de forma independente vigiem o comportamento destas funcionalidades, porque achamos que nós próprios não seremos suficientes, mesmo com os memorandos assinados com instituições relevantes.  Preferimos também manter relações internacionais ao nível da região para melhor consolidação deste propósito, sobretudo quando o crime é transnacional. Para permitir que dessa transnacionalidade não se verifique a repercussão para dentro, dando intranquilidade à circulação de bens e mercadorias, preferimos estabelecer estes acordos com os países da região.

RM: Sr. Presidente, para quando o cachimbo da paz entre a Autoridade Tributária de Moçambique e o sector privado, do ponto de vista da inspecção intrusiva?

R.F: o Cachimbo da paz há-de ser quando o Estado se apropriar do sistema de inspeçcão não intrusiva, porque o contrato de concessão remete ao sector privado, no caso da concessionária, a titularidade dos dispositivos dos equipamentos que foram investidos. Nós, como administração tributária, criámos uma divisão de inspecção à inspecção não intrusiva. E temos feito uma intervenção directa. Aliás os resultados desta intervenção foram várias harmonizações que se encontraram, que deram sucesso à estabilidade do sistema tarifário que já foi pior. De 2007 para aqui é um sistema tarifário minimamente consensual, não idealmente consensual, mas é muito melhor do que aquele que existia em 2006.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Em estudo obrigatoriedade de uso de máquinas fiscais

Está em debate para o seu enriquecimento por agentes económicos activos no país a proposta de regulamento que estabelece a obrigatoriedade de uso de máquinas fiscais e os respectivos procedimentos de aplicação. A introdução destes novos dispositivos electrónicos fiscais para o controlo de vendas a retalho e/ou prestação de serviços, numa primeira fase, e a introdução da facturação electrónica, na fase mais avançada do processo, tem em vista permitir a melhoria da qualidade das informações e consequente aperfeiçoamento dos processos de controlo fiscal. O regulamento aplicar-se-á aos sujeitos passivos do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) que se beneficiam da dispensa de emissão de facturas ou documentos equivalentes, obrigados a emitir talões de venda, bem como aos sujeitos passivos do Imposto sobre Pessoas Colectivas (ISPC) que reúnem os requisitos que o próprio regulamento estabelece. 

O regulamento ora em discussão para o seu enriquecimento considera como máquinas fiscais os equipamentos electrónicos de automatização comercial e fiscal com capacidade de emitir documentos e realizar controlos de natureza fiscal, referentes à transmissão de bens e prestação de serviços devidamente autorizados pela administração tributária. A sua certificação e cessão do seu uso só podem ser efectuadas pela Autoridade Tributária de Moçambique (AT), de modo a garantir a fiabilidade das máquinas, segundo ainda se estabelece no referido regulamento sobre obrigatoriedade de uso de máquinas fiscais para controlo de vendas a retalho e/ou prestação de serviços.

As razões A AT justifica esta nova medida a ser introduzida proximamente no país com o facto de a utilização de máquinas registadoras pelos sujeitos passivos do IVA estar a revelar-se “desajustada ao actual contexto de modernidade tecnológica”, não permitindo um controlo tributário efectivo do volume de vendas realizado pelos agentes económicos e a consequente entrega do IVA devido nas transmissões de bens e prestação de serviços. Avança a proposta de regulamento que porque as máquinas registadoras actualmente em uso e os talões de venda não conferem a adequada fiabilidade para a comprovação do volume de operações efectuadas e o consequente imposto a pagar por a fiscalização apoiar-se no rolo interno da máquina que pelas suas características não conserva os dados pretendidos para confrontação. “Importa, pois, a introdução de outros mecanismos compatíveis com a modernidade tecnológica, nomeadamente, as máquinas fiscais electrónicas, cuja utilização já é prática internacional e regional, podendo-se citar, a título exemplificativo, o Brasil, Quénia, Tanzânia e Zimbabué que já estão a implementar este mecanismo e de forma bem sucedida e com significativa recuperação do IVA ou imposto equivalente sobre o consumo”, explica a AT ainda na sua proposta da nova regulamentação sobre o uso obrigatório de máquinas fiscais.

 O regulamento aplicar-seá aos sujeitos passivos do IVA que se beneficiam da dispensa de emissão de facturas ou documentos equivalentes obrigados a emitir talões de venda, bem como aos sujeitos passivos do ISPC que reúnam os requisitos que o próprio regulamento estabelece. Serão três diferentes tipos de máquinas fiscais a serem usadas, nomeadamente, a Máquina Registadora Fiscal e a Impressora Fiscal vocacionadas para emissão de talões fiscais com memória fiscal incorporada para uso em ambientes de comércio a retalho e o Dispositivo de Assinatura Digital para a emissão de facturas. Por outro lado, o regulamento estabelece a obrigatoriedade dos agentes económicos notificarem a administração tributária nos casos de avaria e furto da máquina fiscal e nos casos de corte de energia eléctrica, permitindo-se, neste interregno, a emissão de talões de venda impressos por tipografias autorizadas ou carimbadas pela administração tributária.